O STF, a Reforma Agrária, a Desapropriação de Imóveis, e a Função Social

O Supremo Tribunal Federal (STF), por unanimidade, decidiu que o cumprimento da função social é um requisito para impedir a desapropriação de um imóvel produtivo para fins de reforma agrária, sob relatoria do Ministro Edson Fachin.

Com objetivo de promover a justiça social no campo, proporcionando acesso à terra para famílias de baixa renda e trabalhadores rurais, a Lei nº 8.629/1993, também conhecida como Lei da Reforma Agrária, estabelece as diretrizes e normas para a execução da reforma agrária no Brasil. Ela trata de diversos aspectos, incluindo os procedimentos e critérios para a desapropriação de terras improdutivas ou que não cumprem sua função social.

Segundo o artigo 9º da Lei da Reforma Agrária, para que uma propriedade rural cumpra sua função social, sua exploração deve atender simultaneamente aos seguintes requisitos: (i) aproveitamento racional e adequado da terra; (ii) utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; (iii) observação das leis e das regulamentações que regem as relações de trabalho no campo; e (iv) promoção do bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores rurais.

Conforme a decisão do STF, não basta que a terra seja produtiva, mas deve, também, atender sua função social. Na ação, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) argumentou que a Lei permitindo a desapropriação de imóveis produtivos que não cumprem a função social os equipara às propriedades improdutivas. A CNA alegou que a exigência simultânea de produtividade e função social seria inconstitucional.

De acordo com a Lei da Reforma Agrária, a terra rural que não cumpre sua função social é aquela que não está sendo utilizada de forma adequada para atender aos princípios estabelecidos na legislação agrária brasileira. De modo geral, a função social da terra, de acordo com essa Lei, envolve diversos aspectos, tais como:

 

  1. Uso produtivo da terra: A propriedade rural deve ser explorada de forma a gerar aproveitamento racional e adequado, produção agrícola, pecuária, agroindustrial ou extrativa, contribuindo para o desenvolvimento econômico da região, respeitando a vocação natural da terra, de modo a manter o potencial produtivo da propriedade;

 

  1. Respeito ao meio ambiente: O uso da terra deve ser realizado de maneira sustentável, preservando os recursos naturais, evitando desmatamento ilegal e promovendo práticas agrícolas que não prejudiquem o ecossistema, a manutenção das características próprias do meio natural e da qualidade dos recursos ambientais, na medida adequada à manutenção do equilíbrio ecológico da propriedade e da saúde e qualidade de vida das comunidades vizinhas;

 

  1. Valorização do trabalho e dignidade do trabalhador rural: A propriedade deve oferecer condições adequadas de trabalho e remuneração justa aos trabalhadores rurais, além de respeitar os direitos trabalhistas, assim como às disposições que disciplinam os contratos de arrendamento e parceria rurais;

 

  1. Bem-estar: A exploração da propriedade deve favorecer o bem-estar dos proprietários e trabalhadores rurais, visando atender às necessidades básicas dos que trabalham na terra, garantir a segurança no trabalho e evitar conflitos e tensões sociais na propriedade rural.

 

Para o Relator da ação, Ministro Edson Fachin, o uso socialmente adequado da propriedade é o que a legitima. O artigo 184 da Constituição Federal autoriza a desapropriação por interesse social de imóveis rurais que não estejam cumprindo sua função social. Já o artigo 185, proíbe a desapropriação de propriedades produtivas e deixa para a legislação complementar a definição dos requisitos relativos à função social. De acordo com o Ministro, a Constituição Federal exige o cumprimento da função social como condição para evitar a desapropriação de propriedades produtivas, cabendo à legislação infraconstitucional definir o significado e alcance do conceito de produtividade.

O caso foi decidido no dia 04/09/2023, na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.865 (ADI), movida pela CNA, contra o artigo 6º e o §1º do art. 9º, da Lei da Reforma Agrária:

Art. 6º Considera-se propriedade produtiva aquela que, explorada econômica e racionalmente, atinge, simultaneamente, graus de utilização da terra e de eficiência na exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente.

 Art. 9º […] § 1º Considera-se racional e adequado o aproveitamento que atinja os graus de utilização da terra e de eficiência na exploração especificados nos §§ 1º a 7º do art. 6º desta lei.

Decisão: o “Tribunal, por unanimidade, julgou improcedente a ação direta de inconstitucionalidade, nos termos do voto do Relator”. Aguarda-se a publicação do acórdão, para acesso à íntegra do voto.

Apesar dos critérios estabelecidos na Lei da Reforma Agrária, é fundamental que o sistema jurídico traga critérios objetivos ao atendimento à função social da propriedade, a fim de evitar discricionariedades e injustiça.

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